Hoje visitámos o grande poeta Fernando Pessoa.
Vivendo por vezes com parentes, outras vezes em quartos alugados, Pessoa ganhava a vida fazendo traduções ocasionais e redação de cartas em inglês e francês para firmas portuguesas com negócios no estrangeiro.
O conteúdo dessa arca – que hoje constitui o Espólio de Pessoa na Biblioteca Nacional de Lisboa – compreende mais de 25 mil folhas com poesia, peças de teatro, contos, filosofia, crítica literária, traduções, teoria linguística, textos políticos, horóscopos e outros textos sortidos, tanto dactilografados como escritos ou rabiscados ilegivelmente à mão, em Português, Inglês e Francês.
Hoje, mais de setenta e cinco anos após a morte de Pessoa, o seu vasto mundo literário ainda não está completamente inventariado pelos estudiosos, e uma importante parte das suas obras em prosa continua à espera de ser publicada.
Fernando António Nogueira Pessoa nasceu em 1888, em Lisboa, aí morreu em 1935, e poucas vezes
deixou a cidade em adulto, mas passou nove anos da sua infância em Durban, na
colónia britânica da África do Sul, onde o seu padrasto era o cônsul Português.
Pessoa,
que tinha cinco anos quando o seu pai morreu de tuberculose, tornou-se num
rapaz tímido e cheio de imaginação, e num estudante brilhante. Pouco depois de
completar 17 anos, voltou a Lisboa para entrar no Curso Superior de Letras, que
abandonou depois de dois anos, sem ter feito um único exame.
Publicou o seu primeiro ensaio de crítica
literária em 1912, o primeiro texto de prosa criativa (um trecho do Livro do
Desassossego) em 1913, e os primeiros poemas de adulto em 1914.
Vivendo por vezes com parentes, outras vezes em quartos alugados, Pessoa ganhava a vida fazendo traduções ocasionais e redação de cartas em inglês e francês para firmas portuguesas com negócios no estrangeiro.
Familiares de Pessoa descreveram-no como afetuoso
e bem humorado, mas muito reservado. Ninguém fazia ideia de quão imenso e
variado era o universo literário acumulado na grande arca onde ia guardando os
seus escritos ao longo dos anos.
O conteúdo dessa arca – que hoje constitui o Espólio de Pessoa na Biblioteca Nacional de Lisboa – compreende mais de 25 mil folhas com poesia, peças de teatro, contos, filosofia, crítica literária, traduções, teoria linguística, textos políticos, horóscopos e outros textos sortidos, tanto dactilografados como escritos ou rabiscados ilegivelmente à mão, em Português, Inglês e Francês.
Pessoa escrevia em cadernos de notas, em folhas
soltas, no verso de cartas, em anúncios e panfletos, no papel timbrado das
firmas para as quais trabalhava e dos cafés que frequentava, em sobrescritos,
em sobras de papel e nas margens dos seus textos antigos. Para aumentar a
confusão, escreveu sob dezenas de nomes, uma prática que começou na infância.
Chamou heterónimos aos mais importantes destes «outros eus», dotando-os de
biografias, características físicas, personalidades, visões políticas, atitudes
religiosas e actividades literárias próprias. Algumas das mais memoráveis obras
de Pessoa escritas em Português foram por ele atribuídas aos três principais
heterónimos poéticos – Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos – e ao
«semi-heterónimo» Bernardo Soares.
Hoje, mais de setenta e cinco anos após a morte de Pessoa, o seu vasto mundo literário ainda não está completamente inventariado pelos estudiosos, e uma importante parte das suas obras em prosa continua à espera de ser publicada.
Deixamos aqui dois dos poemas que nos encantaram, esperamos despertar-vos assim a curiosidade para a leitura deste marco da literatura portuguesa.
Não sei quantas almas tenho
Não sei quantas almas
tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me
estranho.
Nunca me vi nem achei.
De tanto ser, só tenho
alma.
Quem tem alma não tem
calma.
Quem vê é só o que vê,
Atento ao que sou e
vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não
meu.
Sou minha própria
paisagem,
Assisto à minha
passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde
estou.
Por isso, alheio, vou
lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não
prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: “Fui eu?”
Deus sabe, porque o
escreveu.
Fernando Pessoa

Todas as cartas de amor…
Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.
(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)
Fernando
Pessoa
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