quarta-feira, 22 de março de 2023

Deambulando - 12.ºA 1

 Sentinela


Entra-me o verde, ora suave, ora intenso, de manhã pela janela.

Deixo que a brisa pouse em mim enquanto observo o pássaro de sentinela.

Quando, enfim, me recolho, inunda-se a casa de luz e harmonia,

Completa-se o ar com sapiência, virtude e alegria.

 

Estarei então solenemente pronta para começar o dia,

Para sair daquele castelo-casulo da Mãe-Natureza,

Para me sentir absorvida pelo corre-corre que nos guia?

Na cidade, esperam-me os bêbedos matutinos com a sua aspereza,

 

As mulheres a braços com a vida e as contas, com os filhos e os trabalhos,

Absortas entre os apitos e as buzinas, os olhares vagos e os enxovalhos.

Cruzo-me com o cinzento, a bruma de chumbo, a água podre do rio que secou,

Vejo pouco quando tudo me prometeram mas pouco ou nada restou.

 

Ainda cedo, caminho na escola, decidida e com agrado.

Deambulo entre rostos que, como eu, têm o futuro hipotecado!

Dança-me o medo e a incerteza no corpo durante o resto do dia.

Rendo-me à voracidade das horas que me sorvem com ousadia.

 

Sacio então a fome, sentada num banco do jardim.

Chega-me o cheiro reconfortante de uma refeição caseira

que me transporta para casa, ninho, colo, abraço sem fim,

para um mundo onde a felicidade é certeira.

 

Ai! A brisa fria obriga-me a regressar à lúgubre realidade.

É chegada a hora de me render ao negrume que se adensa.

Vislumbro a casa daqueles que juraram castidade

E, em bom rigor, tão depressa a deixaram suspensa.

 

Regresso extenuada, esvaída de esperança.

No horizonte, perfila-se um diabólico rasto vermelho ao fim do dia,

Abandonaram-me a força, o viço, o fulgor e a segurança.

Sou agora um resto de mim, sombra negra, noite fria.

 

Dobro-me sobre mim, aguardo impaciente

por uma salvação deste vórtice que me continua a mortificar,

e me remete para uma morte iminente

porque só assim encontrarei repouso e ânimo para aqui continuar.

Adriana Pereira, N.º 1, 12ºA                       

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